ILUMINAÇÃO ESTIMULA DESENVOLVIMENTO DE SÃO PAULO – HISTÓRIA DA ILUMINAÇÃO – CAP. 9
A história da iluminação pública em São Paulo começou de fato em 1830. No tempo da independência, a cidade ainda conservava certas características de comunidade rural, até que o primeiro presidente da Província de São Paulo, Visconde de Congonhas, trouxe novas expectativas.
Em 1829, 24 lampiões a óleo de mamona emitiam luz com amplos intervalos, enquanto o Governo, instalado no Pátio do Colégio, colocava à disposição da Câmara Municipal lampiões para iluminar suas sessões noturnas. O restante da cidade permanecia nas trevas, a não ser pelas luminárias acesas nas fachadas de algumas casas, por ocasião de festas religiosas ou acontecimentos relacionados com a Casa Real.
Nesse período, a iluminação na Província de São Paulo era precária, limitava-se a uns poucos lampiões, alimentados por óleo de mamona ou óleo de peixe, mantidos por famílias mais abastadas em um pequeno núcleo, que, mais tarde, se transformou na maior cidade do País.
Esses combustíveis eram produzidos nos postos baleeiros de São Sebastião e Ilha Bela e transportados em barricas no lombo de burricos para a Capital, para abastecer os candeeiros de cobre instalados na cadeia pública, nos quartéis e nos hospitais.
Civilização em novo estágio
O advento da tecnologia de iluminação a gásde carvão promoveu evolução constante e, agregada a fatores históricos como a imigração europeia e a cafeicultura, praticamente colocou a comunidade em um novo estágio de civilização.
Na década de 1840, com o aumento no número de veículos e, consequentemente, a alta na quantidade de acidentes noturnos pela iluminação precária, a capital paulista inovou e, em 1847, a Câmara Municipal de São Paulo contratou uma fábrica de gás iluminante. Por intervenção do Governo da Província determinou- se a instalação, em 1840, de 101 lampiões de quatro luzes (um recipiente com quatro faces envidraçadas).
Já, em 1842, institui-se um serviço regular de iluminação e dois anos mais tarde, em 1847, foi firmado acordo com Afonso Milliet, proprietário de uma fábrica de gás de hidrogênio, instalando-se 160 lampiões que permaneciam acesos a noite toda, menos nas noites de luar.
Em 1860, todas as ruas do Bairro de Sá foram iluminadas com um total de 200 lampiões, colocados no alto do poste de ferro. O bairro de Sá sempre serviu como área de teste para a iluminação da cidade, que já contava, no início da década de 60, com 25 mil habitantes. A cidade provinciana começava a se estender pelas várzeas e necessitava de uma nova maneira de iluminar. No ano de 1862, a iluminação passou a ser gerada por azeite fotogênico resinoso.
Em 26 de dezembro de 1863, foi assinado contrato entre Francisco Taques Alvin e José Dutton, para iluminar a cidade com gás de hidrogênio carburado. O contrato valia por 25 anos e, enquanto não construíam a fábrica, os gasômetros, entre outros, os empresários obrigavam-se a iluminar a cidade com querosene.
Em 1869, foi feito um aditamento no contrato, prorrogando por mais dois anos a conclusão dos trabalhos. Em 1870, formou-se, em Londres, a The San Paulo Gaz Co. Ltda, para explorar a concessão. Em outubro do mesmo ano, foram iniciados os assentamentos para gás encanado. A primeira fábrica foi construída entre 1871 e 1872, mas a licença para o funcionamento da The San Paulo Gaz no Império, foi concedida apenas em 28 de agosto de 1872. O Palácio do Governo e a Catedral foram iluminados no dia da inauguração. Em seguida, houve a instalação de 550 lampiões.
Com o reflexo da cafeicultura, São Paulo crescia e a população dobrava. Em maio de 1875, o consumo de gás atingia 2.154 metros cúbicos/dia, havia 753 lampiões na iluminação pública e 300 consumidores particulares. Até 1880, dois gasômetros com capacidade de 2 mil metros cúbicos estavam instalados na fábrica. Foram desmontados em 1908 com a construção do primeiro gasômetro, na Rua da Figueira, cuja capacidade era de 28 mil metros cúbicos. O carvão era transportado por tração animal (1893), numa linha “tramway” bitola 1,05, igual à usada pela Cia. Viação Paulista para transporte de passageiros em bondes de tração animal.
Um aditamento no contrato com a The San Paulo Gaz Company Limited
transformou a iluminação pública de chama de ar livre para luz de gás incandescente. Surgiam os primeiros acendedores de lampiões. Eram 34, em 1884 e 51, em 1896, chamados “Pyrilampos Biscateiros” ou “Vagalumes biscateiros”.
A partir da década de 1870, vários fatores se agregaram na evolução da Província de São Paulo, quando a iluminação pública a gás se instalou em 1872. Pode-se destacar o desenvolvimento da cafeicultura de consequência econômica abrangente para implantação da economia, bem como o surto imigratório europeu a partir de 1880, que contribuiu de forma decisiva para a expansão do comércio e da indústria. Em 1873, já havia 700 lampiões a gás na cidade, que se multiplicaram e caracterizaram a iluminação pública. Eles permaneceram até 1936, quando os últimos lampiões foram definitivamente apagados.
Ascensão e queda do gás
Na fase inicial, o gás era usado basicamente para consumo público. O serviço era amplamente criticado pela imprensa e pelos usuários, que consideravam a luz “muito fraca” e o contínuo aumento das tarifas injustificado, além de uma ausência danosa de fiscalização por parte do governo. Onze anos mais tarde começa a competição com as instalações de energia elétrica, saudada com entusiasmo pela população.
No entanto, dois fatores mantiveram a fonte de gás para iluminação: a iluminação elétrica era ainda mais fraca do que o gás, situação que só foi modificada por volta de 1914, com a evolução da lâmpada, que passou a usar filamentos de ósmio e tungstênio.
Além disso, uma emenda foi acrescentada ao contrato assinado em 1897, autorizando o uso do gás para outros fins, como abastecer fogões e aquecedores, confirmando uma tendência desde a década de 80. Essa iniciativa aumentou o consumo particular de gás e o desenvolvimento de novas técnicas.
Em 1902, iniciou-se a transformação no sistema de iluminação, que passou a usar gás incandescente no lugar de chama ao ar livre. E, em 1912, foi inaugurado o sistema de gás a alta pressão com acendedores incandescentes. A melhoria na qualidade dos serviços também promoveu diminuição nas taxas, aumentando a área atendida. Em 1905, havia 4.558 combustores a gás e, em 1913, este número cresceu para 8.955.
O declínio da iluminação pública a gás começou a partir da I Guerra Mundial. A causa principal foi o aumento no preço do gás, ocasionado pela interrupção do fornecimento de carvão dos Estados Unidos. Os lampiões de rua foram desativados e, em 1917, a Light assinou um grande contrato com o governo, que tentava, em 1920, rescindir o contrato com a Companhia de Gás, cujos serviços para a iluminação tornaram-se obsoletos. Mas isso acabou não ocorrendo até 1929, quando foi assinado novo contrato envolvendo a Companhia de Gás, a Light e o Governo do Estado de São Paulo.
Em abril desse mesmo ano, a Light assumiu o serviço de iluminação pública da cidade, promovendo total substituição da luz a gás no prazo de dois anos. Em dezembro, a Prefeitura garantia exclusividade à Companhia de Gás para o fornecimento deste produto. Em 1936, por um acordo com o governo estadual, o município ficou encarregado dos serviços de fiscalização do fornecimento de gás.
Entre 1929/30, apesar da crise, o governo do Estado iria modificar o sistema de iluminação da cidade, que crescia diariamente, estendendo-se em todas as direções. De 1930 em diante, a empresa ampliou sua rede de alta pressão, expansão que só foi interrompida durante a crise econômica da década de 30 e no curso da II Guerra Mundial.
Em 1959, o governo federal nacionalizou a Companhia de Gás, mudando sua denominação para Companhia Paulista de Gás. Em 1960, com o término da concessão, a empresa encerrava por completo sua expansão, limitando-se à manutenção e conservação das máquinas, tubulações e ao atendimento dos usuários inscritos.
Pelo decreto 7.230, a Prefeitura de São Paulo considerou a empresa de utilidade pública em 1967 e incorporou ao domínio do município todo o seu acervo, além de assumir o controle do gás canalizado em São Paulo. O serviço voltou à esfera municipal e o gás de rua voltou a ocupar lugar de destaque no atendimento das necessidades da população paulistana.
Foram restabelecidas novas ligações familiares e industriais, e todo o acervo da antiga Cia. Paulista de Serviço de Gás declarado de utilidade pública, pelo Decreto municipal 7230, de 26 de outubro de 1967. Nasceu o serviço Municipal de Gás.
Em 1º de novembro de 1968, através da Lei Municipal 7199, a Prefeitura de São Paulo autorizou a constituição de uma sociedade anônima: a Companhia Municipal de Gás – COMGÁS. Em novembro de 1984, a empresa ficou sob o domínio do estado e voltou a fazer parte do ciclo das empresas produtoras de energia na linha de tecnologia de novas fontes como associada da CESP, que, por sua vez, assumiu o controle acionário. Mas ficou na memória da cidade e dos poetas a velha São Paulo dos lampiões a gás.
Eletricidade ganha espaço
No final do século passado a iluminação elétrica convivia com os lampiões a gás. Passaram-se décadas nessa convivência, enquanto evoluía a técnica e geração de eletricidade e de todos os equipamentos necessários a este tipo de energia. A luz elétrica ainda era bastante deficiente e a luz a gás cumpria suas funções. Havia, ainda, uma resistência em aceitar o novo, ou seja, a transmissão em alta tensão.
Vencidas as dificuldades iniciais foram introduzidos os motores de corrente contínua e depois os de corrente alternada, comprovando definitivamente a eficiência e versatilidade da energia elétrica. Empresários das grandes indústrias começaram a ser atraídos pela inovação, embora tivessem outras opções, como o carvão, motores de combustão interna (especialmente o motor a diesel) que podiam acionar motores elétricos, bem como as turbinas a vapor.
A vantagem da energia hidráulica para a geração de eletricidade tornou-se um fator ímpar neste panorama de opções. O sistema foi logo adotado, tanto em países já industrializados como em países onde a economia ainda não era desenvolvida como o Brasil. E não passaram muitos anos para que a energia elétrica tivesse um preço vantajoso. Os equipamentos eram mais limpos, não faziam barulho como os outros sistemas e ainda geravam novos processos industriais, como a eletrólise.
No Brasil, a evolução aconteceu de forma mais lenta. Na primeira fase, estabeleceram-se usinas de pequeno porte para atender à iluminação e ao transporte coletivo e, mais tarde, algumas indústrias. Os anos se passaram e muitas coisas aconteceram desde a fundação da cidade de São Paulo. As vielas e becos transformaram-se em ruas e avenidas, as antigas casas de taipa de pilão, em edifícios, e o lampião a gás, em luminárias de vapor de sódio.
A primeira experiência de iluminação elétrica no Estado de São Paulo foi feita na cidade de Rio Claro, em 1884, com dez lâmpadas de arco, utilizando como fonte uma máquina a vapor. O grupo Light foi o maior empreendimento particular a produzir energia elétrica no Brasil até 1945, em pleno ciclo do café. E o primeiro grande programa de produção de energia elétrica aconteceu por iniciativa da Light, primeiro em São Paulo (1899) e depois no Rio de Janeiro.
A primeira empresa do Grupo Light chamava-se The São Paulo Railway Light and Power Company e foi fundada em 7 de abril de 1899, em Toronto, no Canadá, com capital de US$ 6 milhões. O decreto federal nº 3.334, de 17 de julho de 1899, autorizou sua operação no Brasil, sob o nome The São Paulo Tramway, Light and Power Co. Em 1911, criou-se uma empresa associada, a São Paulo Electric Co. Ltda.
São Paulo continuava crescendo e, a partir de 1899, novas ruas foram abertas e um amplo programa de obras de saneamento e pavimentação de ruas foi realizado, com a iluminação pública acompanhando as modificações.
No ano de 1905, foram instaladas as primeiras lâmpadas elétricas da cidade, na rua Barão de Itapetininga, contratadas com a The São Paulo Tramway, Light and Power Company Ltda. Dois anos depois, 50 lâmpadas de arco iluminaram o triângulo formado pelas ruas Direita, 15 de Novembro e São Bento. Em 1911, a Light assinou o primeiro contrato com o Governo do Estado para iluminação pública.
Em 1916, a cidade de São Paulo contava com 8.605 lampiões a gás e 864 lâmpadas elétricas, de arco ou de filamento. No ano seguinte, iniciou-se a substituição das lâmpadas de arco por incandescentes. Foi com a expansão da economia cafeeira, deslocando o centro exportador do café para São Paulo, que houve um impacto decisivo no processo de urbanização da cidade, gerando a execução de obras que foram acompanhadas novamente pela iluminação pública.
A capital paulista comemorou a construção da represa de Guarapiranga, em 1908, e das usinas hidrelétricas, como Edgard de Souza (em 1901, em Santana do Parnaíba) e Rasgão (em 1925, em Pirapora do Bom Jesus), além da construção da Usina Henry Borden, em Cubatão, cuja primeira máquina entrou em operação em 1926.
Light domina a iluminação pública
Em 1929, a Light dominou completamente o setor de iluminação pública com a eletricidade. Neste mesmo ano, assinou um contrato com o Governo do Estado e a San Paulo Gaz Co. Ao longo dos primeiros 30 anos de prestação de serviços, a Light empenhou-se em expandir cada vez mais o uso da energia elétrica. O morador de São Paulo viu surgir na esplanada do Teatro Municipal, nas ruas e nos jardins quatro lâmpadas de 40 Watts cada uma e com um refletor de acrílico transparente. A experiência não deu certo porque a vida útil dessas lâmpadas era menor do que a de vapor de mercúrio, que começava a despontar na iluminação pública e foi instalada nas ruas centrais da cidade e principais avenidas, como a Nove de Julho e a Dr. Arnaldo. Para isso, foram utilizadas lâmpadas a vapor de mercúrio de
400 Watts e luminárias de alumínio fundido com refletores de alumínio repuxado, revestidos internamente com vidro de boro-silicato prismático.
Esta experiência representou grande evolução nos conceitos e nos resultados de eficiência da iluminação pública em São Paulo. Mas a grande superação tecnológica recaiu sobre as lâmpadas incandescentes. São Paulo permaneceu durante décadas sob a luz incandescente e de mercúrio. Esta última era implantada em locais mais nobres, espalhando-se lentamente pelas avenidas e demais logradouros públicos.
Após o término na Segunda Guerra Mundial houve um grande surto de desenvolvimento em São Paulo, com significativo incremento no consumo de eletricidade. Entre 1952 e 1954, uma nova seca fez com que a Light exigisse um sistema de complementação térmica ao seu conjunto hidrelétrico de geração de energia. Foi projetada a Termoelétrica de Piratininga, nas margens do Rio Pinheiros, em Santo Amaro, bem junto à barragem principal do reservatório da represa Billings. Em 1954, foram inaugurados os dois primeiros grupos de potência total de 200 mil km. A expansão industrial exigiu a implantação do conjunto com a implantação de mais dois grupos.
Nos anos 60, houve uma reestruturação no setor de energia elétrica, que influenciou profundamente a história da concessionária canadense no Brasil. A criação da Eletrobrás, em 1962, marcou a intervenção estatal no setor, com nova orientação para o incremento da produção de energia elétrica no país. Em 1970, durante a ditadura, a Light encerrou suas atividades em solo paulista e o governo assumiu o controle da parte brasileira da empresa. Iniciou-se, assim, o período das estatais como Chesf, Cesp e outras. Até os anos 60, a iluminação pública utilizava lâmpadas incandescentes e em alguns lugares lâmpadas fluorescentes. A partir daí, começou a introdução das lâmpadas de vapor de mercúrio (brancas) nas cidades.
Posteriormente, a partir dos anos 90, houve a introdução das lâmpadas a vapor de sódio (amarelas) e, no século XXI, a introdução de lâmpadas de vapor metálico (brancas), e também das lâmpadas de Led (brancas). Em algumas cidades do interior paulista, todas as lâmpadas são de vapor de sódio (amarelas), tais como: Rio Claro, São Carlos e outras. Na cidade de São Paulo, utiliza-se em maior quantidade as lâmpadas a vapor de mercúrio (brancas) desde o ano de 2001, quando a Prefeitura criou a Ilume para resolver os problemas de iluminação pública de forma mais avançada. Infelizmente o objetivo não foi alcançado, pois durante alguns anos, praticamente ficou estagnada. A partir de 2011, foi retomada mais objetivamente, com o uso de recursos próprios, porém os recursos do chamado Reluz do governo federal ainda não são utilizados.
Coordenação Editorial e Redação: Neide Lamanna
Capa: Raphael Lobosco
Projeto Gráfico: André Siqueira
Ilustração: Raphael Lobosco